terça-feira, 26 de agosto de 2008

Fico bem


A mim agradam-me as fraquezas e fragilidades. Fico feliz quando o copo cai e tranquilo quando o fim é triste. Penso escuro e não me ofusca o sol. Gosto quando chove mas não me assustam as cores da primavera. Sei chorar quando oiço um amo-te, e rir quando chega a hora de alguém partir. E sei ser mais neste cinzento. Reconheço um degrau ao falhar e uma íngreme subida em cada novo obstáculo. Gosto de parar quando todos andam e correr quando o tempo pára. Acordo contente só por saber que não existe nenhuma razão especial para tal..

E gosto de nadas. E incertezas. E vivo bem assim.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Cosmos


Quem somos nós? O que fazemos aqui? Para onde vamos? Mais cedo ou mais tarde todos nos questionamos sobre o sentido da vida, tentamos encontrar uma resposta que justifique a razão de estarmos vivos. Estas perguntas vivem comigo, diria mesmo que fazem parte do que sou, e muitas vezes dou por mim a sentir-me mais pequena do que um grão de areia. Outras julgo-me a dona da verdade e cheia de arrogância lá vou debitando umas frases que rotulo de verdades Universais. Quando sinto exceder-me trago à memória as imagens captadas no espaço pelo telescópio Hubble, apontando o infinito. Esmagador!!!!





Quanto mais penso e sinto estas questões, mais tenho tendência a excluir a religião e a encontrar um denominador comum: independentemente da crença de cada um (cristianismo, budismo, hinduismo,etc), a verdade é que a nossa morada é a mesma e chama-se planeta Terra. Penso não estar a exagerar se disser que esta pode ser uma das poucas verdades Universais, transversal a todos os credos. Então porque é que não paramos para tentar perceber o Universo que nos acolhe e que abarca em si todas as possibilidades e doutrinas religiosas? Se o Cosmos é o palco para os nossos devaneios divinos, porque é que lhe damos tão pouca importância? De que serve rezar o Pai Nosso ou mantrar o OM, se depois maltratamos o planeta que generosamente nos acolhe, e sem o qualquer as nossas vidas seriam nada? Sabemos ao menos que oceanos e terras fazem parte deste mundo?


É curioso pensar que somos feitos da mesma matéria que compõe as estrelas, o Sol e a Lua. Com eles temos em comum o hidrogénio, o magnésio e o sódio. Esta observação científica leva-nos a sentir unos com o Universo e dele depende a sobrevivência da espécie humana. Por isso, talvez mais importante do que erguermos cegamente a bandeira de uma qualquer religião, é cuidar da saúde do nosso querido planeta azul. Confesso achar de uma enorme incoerência seguir à risca, sem questionar, uma série de rituais em nome de Deus, quando bem à nossa frente a Terra definha de dia para dia. Não quererá "Deus", antes de qualquer coisa, que cuidemos da casa que "Ele"nos deu? É que sem ela nenhum Deus pode ganhar forma.


Li a seguinte frase num livro absolutamente fascinante, Cosmos, escrito por Carl Sagan (cientista e astronomo), e que nos chuta para canto no que toca à prepotência humana: "o conhecido é finito, o desconhecido infinito. Intelectualmente estamos numa ilha no meio de um oceano ilimitado de inexplicabilidade. O nosso dever em cada geração é recuperar um pouco mais de terra". Sejamos humildes e cuidemos da nossa casa. Esta é a nossa verdadeira herança ancestral.


segunda-feira, 11 de agosto de 2008


" Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge.
Mas finge sem fingires.
Nada esperes que em ti já não exista,
Cada um consigo é tudo.
Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas.
Sorte se a sorte é tua.
(...)
Aguardo, equânime, o que não conheço -
Meu futuro e o de tudo.
No fim tudo será silêncio, salvo
Onde o mar banhar nada."

Fernando Pessoa

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A ti.



"A pedra fria assentava tão mal em ti. Nem queria acreditar. Desfazias o vinco das calças que sempre preservaste e defendeste como bandeira. Deitado, sem as colagens, sem as línguas, sem ninguém que se preocupasse em perceber o que dizias. Queria tanto contar-te os meus nadas. Aqueles que sempre viravas para gigantescas conquistas. Interessavas-te por tudo menos por isto. Estavas tão magro, parecias feito de pau, rijo, frio, sem respirar, sem rir. O teu nariz, enorme, fazia de ti uma personagem sinistra, tão pouco próxima de ti, tão longe de nós. Luís, repito, luís, angustiou-me ver-te assim. Esta morte, qualquer uma, não era para ti. És feito de vida e vais ficar sempre por aqui."


"Há momentos em que cada pormenor do vulgar ne interessa na sua existência própria, e eu tenho por tudo a afeição de saber ler tudo claramente.(...) Mas também há momentos, e um é este que me oprime agora, em que me sinto mais a mim que às coisas externas, e tudo se me converte numa noite de chuva e lama, perdido na solidão de um apeadeiro de desvio, entre dois comboios de terceira classe."


Fernando Pessoa

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

A passagem das horas



"Nada me prende, a nada me ligo, a nada pertenço.
Todas as sensações me tomam e nenhuma fica.
Sou mais variado que uma multidão de acaso,
Sou mais diverso que o Universo espontâneo,
Todas as épocas me pertencem um momento,
Todas as almas um momento tiveram seu lugar em mim.
Fluido de intuições, rio de supor-mas,
Sempre ondas sucessivas,
Sempre o mar - agora desconhecendo-se
Sempre separando-se de mim, indefinidamente."

Fernando Pessoa